domingo, 6 de janeiro de 2008

Espinhos. Frio. Urtiga. Desníveis. Picadas. Calor. Feridas. Andei por dias dentro da floresta espessa e escura, até que raios de sol fossem mais do que simples miragem [surgindo como espadas que cravam no solo e nas folhas verdes sua lâmina dourada e impiedosa].

Minha pupila se ajusta aos novos níveis de luz.

Agora, aqui, é latente a gama de verdes e formas e tudo com que a natureza me banha.

Sento e enfim respiro na clareira que me é dada.


[contemplar.]



[mais.]




Quando tudo parecia verde e marrom, obra-Natureza, um brilho me cega. Um portão imponente de barras verticais em cobre e colosso se impõe solene à minha frente, adornado em esquecimento mas incrustado de História intemporal, em um Tempo bergsoniano*. Sem nenhum vigia, sem presença humana detectável, sem cadeado na sua entrada. Basta vencer sua inércia e ultrapassar suas linhas.

Às vezes a verdadeira barreira a se vencer não está fora da gente, e sim dentro. Algo em mim não me deixava ir, ao mesmo tempo que uma força sutil [como um pequeno demônio ao pé da orelha] me crispava de ímpeto - cada vez mais - para transpor aquele limite-em-cobre. Simplesmente adentrar.

Minhas forças, escassas. Minha esperança era o que me sobrava de mais forte. Peguei-a e docemente a enrolei em um caule fino de uma margarida com um pedaço de raiz verde (arrancada por ali mesmo, naquele momento). Mal se via a flor escolhida, escondida que estava entre tufos de uma planta-parasita espinhenta.

Despido de minhas esperanças, entrando não sei porquê, simplesmente meu corpo rumava empurrado pelo sol.

Assim, os portões do Inferno ficaram para trás.




... e o encanto** (também verde) se enrosca, aguniado, no caule fino daquela margarida comum - tendo o sol, e apenas ele, como testemunha.











[texto livre inspirado na frase "Vós que aqui entrais, deixai la fora todas as esperanças - Dante." lida no blog Devaneios Desvairados, de Jéssica Amâncio. (brigado, Jé! :)

pra exclarecer: nunca li o livro (espero um dia, com calma, poder corrigir isso), simplesmente a frase me sugeriu essa passagem.



* Em Bergson, o presente coexiste com o passado e o futuro. Cabe à memória distinguir os eventos separadamente. O Tempo é uno.

** "A idéia do futuro, prenhe de uma infinidade de possíveis, é pois mais fecunda do que o próprio futuro, e é por isso que há mais encanto na esperança do que na posse, no sonho do que na realidade." Fonte: Ensaio sobre os dados imediatos da consciência", de Henri Bergson.

2 comentários:

Aprendiz do amor disse...

AH que lindo. amei. a forma como você conseguiu sair do Inferno. e como tinha tentações as suas orelhas! e o Sol, o sol!
brilhante.^^
fico muuuuito feliz por meu blog o ter inspirado!!!=]
pois saiu uma coisa linda dessa inspiração
:)

beijoss.
parabééns pelo texto.a-d-o-r-e-i!

Thaynah disse...

Eu também andei por dias dentro da floresta espessa e escura, a procurar pelo meu caminho, não pelos desníveis, mas pelos inúmeros capilares que rodeiam meu coração.
Meus raios de sol foram diferentes. Vieram de dois olhos-de-esmeralda, e, como num prisma, espalharam todo aquele brilho verde sobre o meu meio metro de altura.
Minha inércia quebrou-se assim. Não por um ímpeto interior, mas por um motivo em carne viva de que se apaixonar é inevitável.

Amo muito você.